Em certo instante inacessível às limitadas coordenadas
temporais, Lao Tsé fazia seu le parkour
habitual pelo umbral dos sonhos da humanidade quando a matéria revolcada e
densa de um pesadelo tenebroso chamou sua atenção. Era Lobão em mais uma de suas
projeções astrais regadas a álcool com rivotril: imaginava-se um avatar da Umbanda com poderes
descontrolados após invocar sem sucesso o Exú Caveira. Lao assumiu uma de suas
dez mil formas, a de Morpheus, pairou sobre o vórtice onírico que avançava
perigosamente sobre o Mundo dos Sonhos, e, com um gesto ameno e intenso como
uma brisa mediterrânea, efervesceu as consequências terríveis da provocação
amadora do
ardiloso Exú.
Ao acordar, Lobão se viu em meio a um quarto destroçado
e garrafas de uísque reduzidas a vidro em pó por suas próprias mãos. Ainda se julgava
uma encapetada vímana transcendental, mas sentia na realidade os efeitos
fortificantes do encontro pessoal com Lao. Curiosamente, a partir deste dia gradualmente
se afastou dos psicotrópicos e das orgias, interessou-se pelos ensinamentos
taoístas e se tornou um de seus seguidores mais ativos e estapafúrdios, praticando
caridade em presídios e compondo canções como “A Queda” e “Você e a Noite
Escura”, dedicadas exclusivamente ao Ancião de Gu-Ren.
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