Muitos se perguntam como Lao Tsé pode viver tanto, ou como atua com discrição tão decisiva em quase todos os campos do saber humano, por toda a Terra. E, embora sejam questões óbvias, passam ao largo do que realmente importa. Seria algo como desvendar a origem do hambúrguer nos tártaros, que conservavam as carnes urinando sobre elas e utilizando-a como confortáveis selas de seus traseiros nus por milhares de quilômetros; ou do protetor solar na pasta de manteiga de leite de égua com a qual os mongóis besuntavam a pele do nascimento até a morte. Meras curiosidades históricas para as quais grande parte da sensível civilização atual não está preparada. Assim, o que importa é que Lao está entre nós, indubitavelmente, tentando reverter os danos da "incerteza metódica" que reduziu a mente humana a um Windows 3.1 e seus pensamentos a uma planilha travada do excel.
Superado isso, há relatos fidedignos de um monólogo ríspido entre Lao Tsé e Marx, bem ao modo destas duas personalidades fortes. Em meio à uma crise de hemorróidas, durante a juventude, Marx viu-se impossibilitado de concluir seus estudos econômico-filosóficos, e, para relaxar, passava os dias sentado em uma bacia de água morna lendo o Dao De Jing. Sua extraordinária concentração e a repetição insistente das estrofes foi capaz de invocar a presença do velho mestre. Uma luz nebulosa invadiu o ambiente. Lao Tsé avançou dela como uma águia e silenciosamente lançou à bacia um pó branco e algumas folhas secas, largando o pequeno alforje curativo sobre o chão. Marx sentiu um borbulhar espumoso adentrar suas partes sensíveis: o alívio veio imediato e permanente como um urro visceral do Manifesto Comunista.
Estava tão feliz que se levantou sem as calças, expondo as indignidades para agradecer por tal milagre tão simples e eficiente. Lao, mantendo sábia distância, deteve o impertinente barbudo com voz macia:
"- Teus intestinos absorveram puro ópio chinês da primeira dinastia. Não sentirás nada por tanto tempo que a cura alcançará inclusive teus maus hábitos, as dores do presente e do futuro. Mas são tênues os limites entre a teriaga e o veneno. O ópio pode ser ambos, e com tal sucesso, que se diz, dos vícios e crenças obsessivas: o ópio é a religião do povo e a religião é o ópio do povo. Em teu caso, o ópio foi apenas o ópio. É a falta de um ou de outro que provoca o dissenso. Se faltam ambos, há harmonia".
A seguir, girou Lao em torno de sua longa túnica e desapareceu em uma bruma, por entre livros desfolhados, panfletos incendiários e uma quantidade estupenda de sanduíches embalados que poderia alimentar um Troll e, contudo, serviam para que o único marxista de batismo criasse sua obra vital sem interrupções. Marx, recomposto, não guardou toda a sabedoria infinita daquelas palavras, e acabou resumindo o encontro medicinal com o velho kitai na famosa crítica à teoria do direito de Hegel. Escreveu-a, segundo dizem, fumando em um longo cachimbo o ópio presenteado por Lao Tsé.
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